Fonte: O Globo
04/11/2007
REF: Consumo Responsável - Erros de Marketing
Consumers International elege os itens que mais afetam os consumidores, todos de multinacionais
por Nadja Sampaio
A matéria é estarrecedora! Como pode uma empresa como a Coca-Cola tão preocupada em transmitir uma imagem de responsabilidade social (vide a entrevista do seu presidente mundial Neville Isdell na seção entrevistas) cometer um erro tão grave!!! Fazer campanhas publicitárias com apelo de "produto saudável" água de torneira é de uma irresponsabilidade incomensurável. No mundo atual, onde a informação circula na velocidade da luz, uma empresa como a Coca-Cola não pode cometer tão grave erro, pois toda o esforço de comunicação e posicionamento de marca, sem nenhum trocadilho, vão por água abaixo. Sem falar nas possibilidade de processos. *Nota do Editor
Água da torneira vendida como mineral; alimentos infantis com o dobro do açúcar recomendado; brinquedos com chumbo; e soníferos para crianças que podem levar ao suicídio. Ficção científica? Fábricas de fundo de quintal? Não. Todos são produtos de empresas multinacionais, com presença global. A fim de denunciar o engodo a que os consumidores são submetidos, a Consumers International elegeu este ano os produtos que mais os prejudicam.
Os eleitos foram a Coca-Cola, por vender água da torneira como se fosse mineral; a Mattel, por vender brinquedos com uma quantidade de chumbo 200 vezes maior que a permitida e culpar a China por isso; a Kellogg, por vender alimentos infantis com 40% de açúcar, quando o recomendado é menos de 20%. O ganhador absoluto foi a Takeda Pharmaceuticals, pelo Rozerem — soníferos para crianças.
A campanha publicitária do medicamento foi veiculada nos Estados Unidos em 2006, sugerindo seu uso para a diminuição do estresse na volta às aulas. A empresa se aproveitou de brechas na legislação americana e não mencionou nos anúncios as advertências sobre os efeitos colaterais, incluindo o possível aumento de pensamentos suicidas.
Os 400 representantes de organizações-membro presentes ao 18º Congresso Internacional da Consumers International, responsáveis pela eleição, levaram em consideração, principalmente, a falta de responsabilidade das multinacionais e o abuso da confiança dos consumidores.
Encontro discute presentes de farmacêuticas para médicos
A Coca-Cola foi obrigada a parar de vender a água Dasani na Inglaterra e desistiu de levá-la para Alemanha e França. Mas as vendas do produto estão aumentando nos EUA, e o produto está tendo grande publicidade em Argentina, Chile, México e outros países da América Latina. A unidade brasileira da empresa afirmou que não comercializa a água Dasani no país.
O presidente da Mattel foi acusado de dificultar uma investigação do Congresso americano sobre a segurança dos seus brinquedos. A Mattel no Brasil foi consultada, mas não se manifestou. A Kellogg foi votada por utilizar métodos persistentes e persuasivos dirigidos às crianças, com o intuito de vender produto com alto conteúdo de gordura, açúcar e sal. Os cereais têm até 40% de açúcar no México; na França, 33%; na Austrália, 36,5%; e na Rússia, 37%. A Kellogg do Brasil afirma que respeita a opinião e a livre manifestação de pessoas e entidades, e esclarece que, de acordo com sua política de marketing global, não faz campanhas publicitárias voltadas para crianças menores de 6 anos. A empresa diz que suas embalagens trazem informações nutricionais e reafirma seu compromisso com a boa alimentação e hábitos saudáveis.
Richard Lloyd, diretor-geral da Consumers International, afirmou que essas companhias multimilionárias têm de ser honestas e transparentes:
— As organizações-membro estão exigindo que essas empresas levem a responsabilidade social a sério.
Um dos assuntos discutidos no congresso foi os presentes que as companhias farmacêuticas dão aos médicos para aumentar as vendas de medicamentos. Um estudo revela que os presentes incluem condicionadores de ar, laptops, títulos de clubes, conferências no exterior em hotéis cinco estrelas, automóveis novos e bolsas de estudo.
— A indústria farmacêutica se aproveita da pobre regulação dos países em desenvolvimento para garantir seus ganhos nos próximos 40 anos. Acreditamos que a melhor maneira de assegurar um tratamento racional e imparcial é proibir completamente a prática de dar presentes aos médicos — afirmou Lloyd.
O congresso, que aconteceu de 20 de outubro 1º de novembro, teve como principais temas o consumo sustentável, a pandemia de obesidade, a ética e publicidade de medicamentos, e o crédito e endividamento dos consumidores. Na abertura do evento, Lloyd destacou que a entidade está se concentrando nos grandes assuntos que demandam soluções internacionais, usando sua influência para identificar abusos e levar a cabo ações coletivas.
Paralelamente às discussões do congresso, foi realizada a assembleia geral, com a presença de 220 organizações de 113 países, que elegeu o novo presidente mundial da Consumers International, Samuel Ochieng. Ele sucederá a brasileira Marilena Lazzarini, coordenadora-executiva do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).
O queniano Ochieng é o primeiro presidente africano da Consumers International. Em seu discurso, ele prometeu dar continuidade ao trabalho desenvolvido por Marilena, que reestruturou a entidade, tornan-do-a mais voltada a campanhas globais e à busca de resultados efetivos nos padrões de consumo.
Representantes de empresas participam pela primeira vez
Outra novidade do congresso foi a participação de representantes do setor de alimentos (Pepsico e Uni-lever) e do setor farmacêutico (Federação Internacional das Associações dos Produtores farmacêuticos). Marcos Pó, consultor técnico do Idec, diz que as discussões foram muito abertas, e um dos pontos destacados pelos representantes das empresas foi o do poder das parcerias improváveis:
— Reconhecemos que temos um pequeno terreno em comum cercado por um mar de divergências, mas devemos ampliar sempre esse terreno. O Idec já vem travando alguns diálogos com as companhias no Brasil. Por exemplo, já conversamos com empresas de fast-food sobre o aperfeiçoamento da informação nutricional e conseguimos mudanças.
O Idec foi eleito membro do Comité Executivo. Para Marilena, o congresso e a assembleia são fundamentais para dar novas energias às organizações de direitos dos consumidores.
Premio internacional aos piores produtos de 2007
Coca-Cola
Na categria de marketing de bebida, por dar continuidade à comercialização internacional de sua água engarrafada, Dasani, apesar de admitir que a água era proveniente das mesmas fontes que a água potável distribuída nas torneiras. Retirada das prateleiras do Reino Unido, em boas vendas em EUA, Argentina, México e outros países da América Latina. Vendida como água mineral, a empresa usava apelos de marketing como "filtrada com um sistema de purificação com tecnologia de ponta", iludindo os consumidores. Segundo a Consumers International, "extrair lucros de fontes frágeis de água é insustentável e irresponsável, e vai contra os direitos básicos dos consumidores de todo o mundo"
Kellogg's
Na categoria pior alimento, a Kellogg's foi a mais votada pelo uso mundial de personagens, como o ogro Shrek, que atraem as crianças. Em 2006, a empresa gastou US$ 916 milhões em publicidade, para vender cereais compostos de até 40% de açúcar, quando o recomendado por especialistas é menos de 20%.
Mattel
Na categoria brinquedos, a mais votada foi a Mattel por criar obstáculos às investigações do Congresso dos Estados Unidos sobre a segurança dos brinquedos e por tentar transferir a responsabilidade do recall que afetou 21 milhões de produtos para os fabricantes chineses. Um dos brinquedos afetados pelo recall ocorrido este ano continha mais de 200 vezes a quantidade de chumbo, permitida nos EUA.
Takeda Pharmaceuticals
O vencedor geral foi da categoria de marketing farmacêutico, para a Takeda Pharmaceuticals, com o produto Rozerem, que são pílulas para dormir para crianças. A campanha foi veiculada nos Estados Unidos em 2006, na época das volta às aulas, e a empresa foi considerada duplamente irresponsável ao se aproveitar de brechas na legislação e por não informar no anúncio que um dos efeitos colaterais do produto era aumentar a frequência de pensamentos suicidas em pacientes depressivos.
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